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sábado, 24 de julho de 2010

Toca

Eliane F.C.Lima

Bicho escondido na toca,
um olho negro no escuro,
a ilha é seu próprio corpo,
sem porto e sem farol.
Um mundo, cores que passam,
vozes, riso, movimento.
Cá dentro – som de lamento? –
silêncio é negridão.
Um aberto e negro olho,
espreita o mundo lá fora.
A porta não é saída,
a porta não é entrada.
Bicho escondido na toca,
um olho negro não chora.
E nada há que se faça,
nenhuma via é estrada,
nenhuma cobiça do sol,
fútil e inútil porta,
cobiça é da vida morta,
vida e alma que lá vão.

domingo, 18 de julho de 2010

Encontro

Eliane F.C.Lima

Miro a mulher parada,
ela virada pra fora.
Será que vê a paisagem?
Esgazear de olhos negros,
ares de enxergar o nada.
O que será que espia,
fita, investiga, espreita?
Parece esperar alguém...
um eu que de fora vem?
Encostada na esquadria,
a porta, de par em par,
seu corpo é como miragem.
As mãos, vaguidão em cada;
os pés, um já vai voar;
o rosto voltado, embora
pareça ao errante afeita.
Com que será que ela sonha:
futuro, mar, querubim?
Por ordem de deuses gregos?
Será por pura peçonha?
Ela olha para mim.
Fascinada, olho a mulher:
está nela a minha face.
E, sem qualquer mais disfarce,
é a mim que ela quer.

sábado, 10 de julho de 2010

Profanação

Eliane F.C.Lima

No pântano, úmido e escuro,
nasce uma planta verde.
Não vê, em volta, o lodo,
fixa o claro do céu.

Encanto da lama cinza,
o verde viola a vasa.
A vida de novo vibra,
raio de sol brotado.

domingo, 4 de julho de 2010

Vagante

Eliane F.C.Lima

Tenho uma alma penada,
que mora dentro de mim.
Anda arrastando correntes,
caminha por quartos ermos,
enormes salas vazias,
lençóis brancos sobre móveis,
escadas em caracol,
levando a lugar nenhum.
De lá se desce voando,
levitando feito espuma.
No sótão há coisas velhas,
porão?, só há coisas mortas,
ratos e teias de aranhas,
que velam pelo silêncio,
se escondem,
se há gemido:
o desespero da alma,
fechando e abrindo portas.