Eliane F.C.Lima
Nasci e a vida já indo:
um roteiro pela frente,
enorme estrada de luz.
Hoje, as luzes se apagando,
aperto os olhos e ando,
agora, já devagar.
E percebo, inutilmente,
que o caminho é só voltar.
domingo, 26 de setembro de 2010
domingo, 19 de setembro de 2010
Totalidade
Eliane F.C.Lima
Se me defino, eu me reduzo.
Aparo arestas, corto esquinas
e me arredondo.
Se me arredondo, eu me reduzo,
se é o círculo a perfeição.
Se sou perfeita, eu me reduzo,
tinha de um lado, tinha de outro,
o mau e o bom.
Se sou bondade, eu me reduzo.
Sou céu, sou chão,
ave altaneira, reptil cobra.
Se sou só cobra, eu me reduzo,
quero rastejo e quero voo.
Ser cobra e ave e peixe e lua,
se fico opaca e se eu luzo,
se sou a falta e sou a sobra,
faço o meu mundo para meu uso.
Se me defino, eu me reduzo.
Aparo arestas, corto esquinas
e me arredondo.
Se me arredondo, eu me reduzo,
se é o círculo a perfeição.
Se sou perfeita, eu me reduzo,
tinha de um lado, tinha de outro,
o mau e o bom.
Se sou bondade, eu me reduzo.
Sou céu, sou chão,
ave altaneira, reptil cobra.
Se sou só cobra, eu me reduzo,
quero rastejo e quero voo.
Ser cobra e ave e peixe e lua,
se fico opaca e se eu luzo,
se sou a falta e sou a sobra,
faço o meu mundo para meu uso.
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
Aniversário do blogue

Eliane F.C.Lima
Gesto dentro de mim uma lagarta prateada
que tormentosa não se quer dar ao mundo.
Da borboleta despreza o colorido profano.
É o sozinho seu campo de batalha,
a escuridão seus ataques contínuos,
o recuar o seu golpe fatal.
E se enrosca... e luta,
e se introverte... e lança.
(Agradeço aqui a foto lá de cima ao site "Imagens por favor." (link)
E aqui está a nova postagem, que havia sido colocada ontem, dia do aniversário, mas que transfiro para hoje, para que não fique esquecida lá atrás.
O mutante
Eliane F.C.Lima
Misturado a outros animais,
é anjo, sereia, centauro, esfinge,
cabeça humana sobre todos.
Insatisfeito, vira deus.
E expulsa a si mesmo do paraíso.
(Em 12-09-2010)
Quem gostou de meu poema está convidado a ler meu novo conto em Conto-gotas (link) e minha postagem sobre Helena Kolody em Literatura em vida 2 (link).
domingo, 5 de setembro de 2010
Das especificidades do amor
domingo, 29 de agosto de 2010
Macia seda
Eliane F.C.Lima
(Homenagem ao engenho musical de Michel F.M.)
Um anjo canta,
som masculino,
seu doce mantra.
Ainda menino,
claves de sol,
semicolcheias,
são suas teias.
Com passo leve
– a vida é breve –,
não toca harpa,
não toca sino,
só seu destino.
Dedilha cordas,
retira a farpa
que fere o ouvido
de nossa vida.
De tão menino,
de tão canoro,
me afaga o ombro,
me embala o sono,
divina lida.
(Homenagem ao engenho musical de Michel F.M.)
Um anjo canta,
som masculino,
seu doce mantra.
Ainda menino,
claves de sol,
semicolcheias,
são suas teias.
Com passo leve
– a vida é breve –,
não toca harpa,
não toca sino,
só seu destino.
Dedilha cordas,
retira a farpa
que fere o ouvido
de nossa vida.
De tão menino,
de tão canoro,
me afaga o ombro,
me embala o sono,
divina lida.
(Escrevi este poema, surpresa com o talento criativo e a voz jovial de Michel F.M., um de meus seguidores, em seu blogue ÁSPERA SEDA (convido-o a visitá-lo aqui). Sempre me deixa crente no futuro o encontro da juventude com a poesia.
domingo, 22 de agosto de 2010
Enlace
Eliane F.C.Lima
Asas abertas, plana alto o anjo,
Busca, agudos olhos, o seu deus.
Luz solitária, vento amigo e brando,
sobre as nuvens – pássaro sem os seus?
Enormes asas, boi, montanha, lago,
pequena sombra erra pelo chão.
Achará, hoje, um dia, assim voando,
a quem procura, um rumo torto e vago?
Asas intensas, agora, entre as estrelas,
até a lua, baixa à rua, à várzea nua,
perscruta, atento, a cada vão desvão,
se vê imagens, voa, ali, ao vê-las.
Abertas asas, fugiu ao paraíso?
Não estava lá aquilo a que buscava?
Um par sem mancha, aberto, voa alto,
a face calma, mesmo sem sorriso.
E, finalmente, asas em sobressalto,
uma pessoa, abaixo, segue dura.
Desfeito todo em ternura e gratidão,
enxerga nela o criador a criatura.
Asas abertas, plana alto o anjo,
Busca, agudos olhos, o seu deus.
Luz solitária, vento amigo e brando,
sobre as nuvens – pássaro sem os seus?
Enormes asas, boi, montanha, lago,
pequena sombra erra pelo chão.
Achará, hoje, um dia, assim voando,
a quem procura, um rumo torto e vago?
Asas intensas, agora, entre as estrelas,
até a lua, baixa à rua, à várzea nua,
perscruta, atento, a cada vão desvão,
se vê imagens, voa, ali, ao vê-las.
Abertas asas, fugiu ao paraíso?
Não estava lá aquilo a que buscava?
Um par sem mancha, aberto, voa alto,
a face calma, mesmo sem sorriso.
E, finalmente, asas em sobressalto,
uma pessoa, abaixo, segue dura.
Desfeito todo em ternura e gratidão,
enxerga nela o criador a criatura.
domingo, 15 de agosto de 2010
Hoy
Eliane F.C.Lima
No soy ojo,
yo soy boca.
Recibo cuando me doy.
No me quedo y miro el mundo,
miro el mundo por mis manos,
yo soy mundo en lo que soy.
Oigo el pasado, el futuro,
pero vivo, vivo hoy.
Miro el mundo por mis pies,
nos pasos en que yo voy.
Miro el mundo en tu mirada,
en tu mirada caliente,
donde veo, veo el pueblo,
donde llora nuestra gente.
Há postagens novas em meus blogues Literatura em vida 2 (aqui o caminho) e Conto-gotas (vá nessa direção).
No soy ojo,
yo soy boca.
Recibo cuando me doy.
No me quedo y miro el mundo,
miro el mundo por mis manos,
yo soy mundo en lo que soy.
Oigo el pasado, el futuro,
pero vivo, vivo hoy.
Miro el mundo por mis pies,
nos pasos en que yo voy.
Miro el mundo en tu mirada,
en tu mirada caliente,
donde veo, veo el pueblo,
donde llora nuestra gente.
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domingo, 8 de agosto de 2010
Cor, cordis
Eliane F.C.Lima
Não guarde o coração na gaveta para deixar que ele bata mais tarde, quando você não tiver mais nada de importante para fazer;
não guarde o coração no bolso e o deixe esquecido lá, para só encontrá-lo, surpresa, quando vestir aquela velha calça incômoda;
não esqueça o coração em cima do armário que você só alcança, quando pega a pesada e insuportável escada de armar;
não perca o coração no meio dos livros que você deixou para ler não sei quando;
nenhum esforço vale o descompassado e sudorífero bater do coração vexado, surpreendido, flagrado, tartamudo, boquiaberto, trêmulo de amor.
Confira, também, meus blogues Conto-gotas (vá por aqui) e Literatura em vida 2 (o caminho é este).
Não guarde o coração na gaveta para deixar que ele bata mais tarde, quando você não tiver mais nada de importante para fazer;
não guarde o coração no bolso e o deixe esquecido lá, para só encontrá-lo, surpresa, quando vestir aquela velha calça incômoda;
não esqueça o coração em cima do armário que você só alcança, quando pega a pesada e insuportável escada de armar;
não perca o coração no meio dos livros que você deixou para ler não sei quando;
nenhum esforço vale o descompassado e sudorífero bater do coração vexado, surpreendido, flagrado, tartamudo, boquiaberto, trêmulo de amor.
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segunda-feira, 2 de agosto de 2010
O absoluto
Eliane F.C.Lima
O silêncio de olhar,
o silêncio de ouvir.
O lento movimento,
de mansinho,
um vento sorrateiro,
leve brisa,
instaurada a paz de ninho.
A calma absoluta,
a luz pouca,
olhar sem sentir medo,
sem a roupa,
que cobre o corpo,
a alma:
a armadura.
Abrir – silêncio! – a estrutura
e espionar o fora,
mansamente.
O silêncio de olhar,
o silêncio de ouvir.
O lento movimento,
de mansinho,
um vento sorrateiro,
leve brisa,
instaurada a paz de ninho.
A calma absoluta,
a luz pouca,
olhar sem sentir medo,
sem a roupa,
que cobre o corpo,
a alma:
a armadura.
Abrir – silêncio! – a estrutura
e espionar o fora,
mansamente.
sábado, 24 de julho de 2010
Toca
Eliane F.C.Lima
Bicho escondido na toca,
um olho negro no escuro,
a ilha é seu próprio corpo,
sem porto e sem farol.
Um mundo, cores que passam,
vozes, riso, movimento.
Cá dentro – som de lamento? –
silêncio é negridão.
Um aberto e negro olho,
espreita o mundo lá fora.
A porta não é saída,
a porta não é entrada.
Bicho escondido na toca,
um olho negro não chora.
E nada há que se faça,
nenhuma via é estrada,
nenhuma cobiça do sol,
fútil e inútil porta,
cobiça é da vida morta,
vida e alma que lá vão.
Bicho escondido na toca,
um olho negro no escuro,
a ilha é seu próprio corpo,
sem porto e sem farol.
Um mundo, cores que passam,
vozes, riso, movimento.
Cá dentro – som de lamento? –
silêncio é negridão.
Um aberto e negro olho,
espreita o mundo lá fora.
A porta não é saída,
a porta não é entrada.
Bicho escondido na toca,
um olho negro não chora.
E nada há que se faça,
nenhuma via é estrada,
nenhuma cobiça do sol,
fútil e inútil porta,
cobiça é da vida morta,
vida e alma que lá vão.
domingo, 18 de julho de 2010
Encontro
Eliane F.C.Lima
Miro a mulher parada,
ela virada pra fora.
Será que vê a paisagem?
Esgazear de olhos negros,
ares de enxergar o nada.
O que será que espia,
fita, investiga, espreita?
Parece esperar alguém...
um eu que de fora vem?
Encostada na esquadria,
a porta, de par em par,
seu corpo é como miragem.
As mãos, vaguidão em cada;
os pés, um já vai voar;
o rosto voltado, embora
pareça ao errante afeita.
Com que será que ela sonha:
futuro, mar, querubim?
Por ordem de deuses gregos?
Será por pura peçonha?
Ela olha para mim.
Fascinada, olho a mulher:
está nela a minha face.
E, sem qualquer mais disfarce,
é a mim que ela quer.
Miro a mulher parada,
ela virada pra fora.
Será que vê a paisagem?
Esgazear de olhos negros,
ares de enxergar o nada.
O que será que espia,
fita, investiga, espreita?
Parece esperar alguém...
um eu que de fora vem?
Encostada na esquadria,
a porta, de par em par,
seu corpo é como miragem.
As mãos, vaguidão em cada;
os pés, um já vai voar;
o rosto voltado, embora
pareça ao errante afeita.
Com que será que ela sonha:
futuro, mar, querubim?
Por ordem de deuses gregos?
Será por pura peçonha?
Ela olha para mim.
Fascinada, olho a mulher:
está nela a minha face.
E, sem qualquer mais disfarce,
é a mim que ela quer.
sábado, 10 de julho de 2010
Profanação
Eliane F.C.Lima
No pântano, úmido e escuro,
nasce uma planta verde.
Não vê, em volta, o lodo,
fixa o claro do céu.
Encanto da lama cinza,
o verde viola a vasa.
A vida de novo vibra,
raio de sol brotado.
No pântano, úmido e escuro,
nasce uma planta verde.
Não vê, em volta, o lodo,
fixa o claro do céu.
Encanto da lama cinza,
o verde viola a vasa.
A vida de novo vibra,
raio de sol brotado.
domingo, 4 de julho de 2010
Vagante
Eliane F.C.Lima
Tenho uma alma penada,
que mora dentro de mim.
Anda arrastando correntes,
caminha por quartos ermos,
enormes salas vazias,
lençóis brancos sobre móveis,
escadas em caracol,
levando a lugar nenhum.
De lá se desce voando,
levitando feito espuma.
No sótão há coisas velhas,
porão?, só há coisas mortas,
ratos e teias de aranhas,
que velam pelo silêncio,
se escondem,
se há gemido:
o desespero da alma,
fechando e abrindo portas.
Tenho uma alma penada,
que mora dentro de mim.
Anda arrastando correntes,
caminha por quartos ermos,
enormes salas vazias,
lençóis brancos sobre móveis,
escadas em caracol,
levando a lugar nenhum.
De lá se desce voando,
levitando feito espuma.
No sótão há coisas velhas,
porão?, só há coisas mortas,
ratos e teias de aranhas,
que velam pelo silêncio,
se escondem,
se há gemido:
o desespero da alma,
fechando e abrindo portas.
domingo, 27 de junho de 2010
Sacrifício em nome do amor
Eliane F.C.Lima
Romântica,
iria até as alturas
e lhe daria um céu estrelado.
Como não posso,
prática,
vou até a cozinha
e lhe dou um ovo estrelado
Romântica,
iria até as alturas
e lhe daria um céu estrelado.
Como não posso,
prática,
vou até a cozinha
e lhe dou um ovo estrelado
domingo, 20 de junho de 2010
O eterno retorno
Eliane F.C.Lima
Voltar sempre mulher,
se são dadas outras vidas.
Impossível diferente,
reconstruindo o mundo,
evitando o despedaço,
segurando sempre os cacos,
o mundo sempre explodido.
Voltar, eterna mulher,
apagando o velho mundo,
desenhando outros contornos,
outros modos, outros estares,
viver ser só fraternar.
Mulher, ser sempre mulher,
querer somente o ficar,
querer somente o querer,
cobiçar somente a vida,
juntar e unir os pedaços,
fazer do pó o inteiro.
Voltar sempre mulher,
se são dadas outras vidas.
Impossível diferente,
reconstruindo o mundo,
evitando o despedaço,
segurando sempre os cacos,
o mundo sempre explodido.
Voltar, eterna mulher,
apagando o velho mundo,
desenhando outros contornos,
outros modos, outros estares,
viver ser só fraternar.
Mulher, ser sempre mulher,
querer somente o ficar,
querer somente o querer,
cobiçar somente a vida,
juntar e unir os pedaços,
fazer do pó o inteiro.
domingo, 13 de junho de 2010
Cartão-postal

Olho aquele Pão-de-açúcar,
morro, pedra e enfado,
de bondinhos e turistas,
barcos, banhistas aos pés.
Às vezes, no meio de [nuvens,
esconde o rosto, cansado,
esquecer tanta euforia.
Saudade de tempo passado,
índios, nudez e silêncio,
trilhas de pés descalços,
rostos quietos na mata,
banhos em rios sem sal.
Olho o morro:
seu corpo finge o azul,
esconde seu verde mato,
esconder-se-ia todo,
não fosse assim gigante,
não fosse assim parado,
navio fixo no mar,
âncoras pra sempre fundas.
Fugindo na água à fora,
longe de grandes navios,
perder-se-ia nas brumas,
terras ainda não vistas,
praias jamais nadadas,
ninguém pra ver ou falar.
Mas está tão encalhado,
eternamente calado,
seu pranto salga o mar.
domingo, 6 de junho de 2010
Velha história
Eliane F.C.Lima
Havia orgulho em mim.
De mim.
Hoje sou só uma lembrança do passado.
Como as velhas avós.
Entrei para o álbum de fotografias,
daqueles que partiram
e não são lembrados,
nem com saudade.
São caras estranhas.
Os antigos, guardiães das memórias,
contam histórias sobre eles.
A que os novos não prestam atenção.
Embora ainda caminhe por aqui,
e viva por aqui,
meu rosto, já esfumaçando,
amarelece entre os defuntos retratos.
Havia orgulho em mim.
De mim.
Hoje sou só uma lembrança do passado.
Como as velhas avós.
Entrei para o álbum de fotografias,
daqueles que partiram
e não são lembrados,
nem com saudade.
São caras estranhas.
Os antigos, guardiães das memórias,
contam histórias sobre eles.
A que os novos não prestam atenção.
Embora ainda caminhe por aqui,
e viva por aqui,
meu rosto, já esfumaçando,
amarelece entre os defuntos retratos.
domingo, 30 de maio de 2010
Lavra-dor
Eliane F.C.Lima
Em mim, a única coisa que brilha
é o metal de minha marmita fria,
quando bate o raio de sol.
A única coisa que bebo
é o suor de meu rosto,
quando bate o raio de sol.
O único animal que vejo
são os chifres largados no chão,
quando bate o raio de sol.
A única árvore onde encosto
é um tridente seco,
quando bate o raio de sol.
A única coisa que falo
é “Vida, vida... “,
quando bate o raio de sol.
Mas matuto tudo,
mas espero tudo;
e todos os brilhos,
inclusive o da faca;
e todos os líquidos,
inclusive o sangue;
e todos os animais,
inclusive a cascavel;
e todas as madeiras,
inclusive a cruz;
e todas as palavras,
inclusive “Morte!”,
quando, à noite,
não bate mais o raio de sol.
Em mim, a única coisa que brilha
é o metal de minha marmita fria,
quando bate o raio de sol.
A única coisa que bebo
é o suor de meu rosto,
quando bate o raio de sol.
O único animal que vejo
são os chifres largados no chão,
quando bate o raio de sol.
A única árvore onde encosto
é um tridente seco,
quando bate o raio de sol.
A única coisa que falo
é “Vida, vida... “,
quando bate o raio de sol.
Mas matuto tudo,
mas espero tudo;
e todos os brilhos,
inclusive o da faca;
e todos os líquidos,
inclusive o sangue;
e todos os animais,
inclusive a cascavel;
e todas as madeiras,
inclusive a cruz;
e todas as palavras,
inclusive “Morte!”,
quando, à noite,
não bate mais o raio de sol.
domingo, 23 de maio de 2010
Dia de descanso
Eliane F.C.Lima
Como hoje é domingo,
como pelas beiradas o desespero,
evitando o em cheio do sofrido.
A alegria está impressa em todos os programas,
na praia, no cinema, nos churrascos.
A alegria é o espetáculo,
está clara no céu
e debaixo dos guarda-sóis.
Vibra nos pandeiros.
Não há dor aos domingos nos calendários.
Como hoje.
Como hoje é domingo,
como pelas beiradas o desespero,
evitando o em cheio do sofrido.
A alegria está impressa em todos os programas,
na praia, no cinema, nos churrascos.
A alegria é o espetáculo,
está clara no céu
e debaixo dos guarda-sóis.
Vibra nos pandeiros.
Não há dor aos domingos nos calendários.
Como hoje.
domingo, 16 de maio de 2010
De lama, mala e alma
Eliane F.C.Lima
Saio dessa lama
como um cachorro molhado
e me sacudo toda,
dissipando o sofrimento.
Pelo e alma limpa,
pego minha mala,
vou viver de novo.
Saio dessa lama
como um cachorro molhado
e me sacudo toda,
dissipando o sofrimento.
Pelo e alma limpa,
pego minha mala,
vou viver de novo.
domingo, 9 de maio de 2010
Renovação
Eliane F.C.Lima
Sapatos novos é o que se quer,
e móveis novos sempre cheiram bem,
e roupas novas dão prazer e graça.
Amigos novos venham ao meu encontro,
que desses, pelo menos, guardo ainda,
a esperança nova da amizade
Dedicado às minhas novas amigas Ju Rigoni e Renata A.S. Raposo, que mostraram o quanto meu poema era premonitório e feliz.
Sapatos novos é o que se quer,
e móveis novos sempre cheiram bem,
e roupas novas dão prazer e graça.
Amigos novos venham ao meu encontro,
que desses, pelo menos, guardo ainda,
a esperança nova da amizade
domingo, 2 de maio de 2010
Amor
Eliane F.C.Lima
Narcisa se debruça sobre o lago,
espelho verde, vítreo e cristalino.
Tudo é paz, e no silêncio de abandono,
umas folhas soltas, rumo vago,
umas sombras frias e sem tino,
por cima, uma flor boia sem dono.
Sorridente, ela já precisa
recolher negros cabelos com as mãos.
Mas surgem logo, de ouro, outros cabelos,
outros olhos como os seus tão sãos.
Se tão surpresa, vê, então, Narcisa,
louras madeixas que ela também quer,
dois rostos vivos n’água transparente,
aberto outro sorriso de mulher,
incontrolável, se apaixona de repente.
Narcisa se debruça sobre o lago,
espelho verde, vítreo e cristalino.
Tudo é paz, e no silêncio de abandono,
umas folhas soltas, rumo vago,
umas sombras frias e sem tino,
por cima, uma flor boia sem dono.
Sorridente, ela já precisa
recolher negros cabelos com as mãos.
Mas surgem logo, de ouro, outros cabelos,
outros olhos como os seus tão sãos.
Se tão surpresa, vê, então, Narcisa,
louras madeixas que ela também quer,
dois rostos vivos n’água transparente,
aberto outro sorriso de mulher,
incontrolável, se apaixona de repente.
quarta-feira, 7 de abril de 2010
Obra-prima
Eliane F.C.Lima
No quadro de minha janela,
a natureza pintora:
o verde de uma mangueira,
vermelhos de suas frutas,
recortes de azul do céu,
jogados atrás de tudo.
Não é natureza morta:
um vento, de improviso,
desorganiza o conjunto,
aviva as folhas paradas,
ameaça as maduras,
torna mais cara a pintura.
Um pássaro pequenino,
amarelo dentro do ninho:
pingo de tinta borrado.
No quadro de minha janela,
a natureza pintora:
o verde de uma mangueira,
vermelhos de suas frutas,
recortes de azul do céu,
jogados atrás de tudo.
Não é natureza morta:
um vento, de improviso,
desorganiza o conjunto,
aviva as folhas paradas,
ameaça as maduras,
torna mais cara a pintura.
Um pássaro pequenino,
amarelo dentro do ninho:
pingo de tinta borrado.
quinta-feira, 25 de março de 2010
Improváveis ecos urbanos
Eliane F.C.Lima
A paz é um latido ao longe:
traz recordações de não sei quê,
de não sei onde,
mas inunda a alma de saudade
do que fica no passado.
A paz é uma chuvinha elegante,
pouca, levemente fria,
que vem quando se precisa
que se vai na hora certa.
A paz é um dia de sol fraco
e uma brisa intermitente,
que refresca,
mas não dá arrepio.
A paz é um silêncio bom,
longe um som de carros pressentido,
numa estrada indefinida,
que não se vê,
que não chega aqui.
A paz é um latido ao longe:
traz recordações de não sei quê,
de não sei onde,
mas inunda a alma de saudade
do que fica no passado.
A paz é uma chuvinha elegante,
pouca, levemente fria,
que vem quando se precisa
que se vai na hora certa.
A paz é um dia de sol fraco
e uma brisa intermitente,
que refresca,
mas não dá arrepio.
A paz é um silêncio bom,
longe um som de carros pressentido,
numa estrada indefinida,
que não se vê,
que não chega aqui.
domingo, 21 de março de 2010
SALVE O DIA INTERNACIONAL DA POESIA!
Se sempre vibra em mim a poesia,
viva eu, salve ela, salve o dia!
Dia 21 de março.
viva eu, salve ela, salve o dia!
Dia 21 de março.
terça-feira, 16 de março de 2010
Um poema mais para o amor do que para o patriótico
Eliane F.C.Lima
Era uma vez um rio amarelo,
que se dividia em mil cachoeirinhas.
Às vezes, radical, pulava, em todos os tons do amarelo.
Às vezes, ainda, misturavam-se todos esses dons.
E corria loucamente, meio infernal!
Era uma vez outro rio,
que seguia manso,
e se espelhava em todos os tons do azul,
mas nunca um azul berrante,
sempre azul doce...
E corria sensatamente, meio invernal.
E, numa curva, os dois rios se encontravam:
e, era um pular amarelo-azul.
E corriam ora infernais, ora invernais.
E não se dividiam mais, num só tom, caudalosamente verde.
Era uma vez um rio amarelo,
que se dividia em mil cachoeirinhas.
Às vezes, radical, pulava, em todos os tons do amarelo.
Às vezes, ainda, misturavam-se todos esses dons.
E corria loucamente, meio infernal!
Era uma vez outro rio,
que seguia manso,
e se espelhava em todos os tons do azul,
mas nunca um azul berrante,
sempre azul doce...
E corria sensatamente, meio invernal.
E, numa curva, os dois rios se encontravam:
e, era um pular amarelo-azul.
E corriam ora infernais, ora invernais.
E não se dividiam mais, num só tom, caudalosamente verde.
domingo, 7 de março de 2010
Paisagem
Eliane F.C.Lima
Folhas de bananeiras:
pentes verdes, flexíveis,
desembaraçam o horizonte,
embolado pelo vento.
Folhas de bananeiras:
pentes verdes, flexíveis,
desembaraçam o horizonte,
embolado pelo vento.
domingo, 28 de fevereiro de 2010
Serenidade
Eliane F.C.Lima
Neste momento há paz.
Pode ser o mormaço
ou as roupas no varal,
sobre fios do passado.
Têm cheiro de sabão,
sem requinte de perfume.
Só mansidão e sinceridade,
tremulam sua certeza.
Pode ser o vento,
franjando folhas compridas:
balançam tais verdes vizinhos,
inconscientes bananas futuras.
Podem ser os pardais,
resguardados de gaiolas,
seu plebeísmo, liberdade garantida.
Trilam e se perseguem,
voo de alegria, rotina própria,
valor do apenas pássaro,
flor castanha que atravessa.
Este momento é a tarde,
nuvens de quadros no céu,
vagamente vagabundas.
Nada, agora, é muito ou pouco.
O simples sempre é a paz.
Neste momento há paz.
Pode ser o mormaço
ou as roupas no varal,
sobre fios do passado.
Têm cheiro de sabão,
sem requinte de perfume.
Só mansidão e sinceridade,
tremulam sua certeza.
Pode ser o vento,
franjando folhas compridas:
balançam tais verdes vizinhos,
inconscientes bananas futuras.
Podem ser os pardais,
resguardados de gaiolas,
seu plebeísmo, liberdade garantida.
Trilam e se perseguem,
voo de alegria, rotina própria,
valor do apenas pássaro,
flor castanha que atravessa.
Este momento é a tarde,
nuvens de quadros no céu,
vagamente vagabundas.
Nada, agora, é muito ou pouco.
O simples sempre é a paz.
sábado, 20 de fevereiro de 2010
Reflexões de aniversário
O dito
(Primeira reflexão de aniversário)
Eliane F.C.Lima
Caminhando, só olho o norte,
ninguém me peça para olhar para trás.
O que foi, foi. Passado não passa.
O passo caminha, sem medo de corte.
A vida é coisa que vai para a frente,
a vida viaja puxando a sorte,
e, boa ou má, só para com a morte.
A resposta
(Segunda reflexão de aniversário)
Eliane F.C.Lima
Nesta vida tenho caminhado
e nem a morte me há de parar,
porque sou "mar
nunca dantes navegado."
(Primeira reflexão de aniversário)
Eliane F.C.Lima
Caminhando, só olho o norte,
ninguém me peça para olhar para trás.
O que foi, foi. Passado não passa.
O passo caminha, sem medo de corte.
A vida é coisa que vai para a frente,
a vida viaja puxando a sorte,
e, boa ou má, só para com a morte.
A resposta
(Segunda reflexão de aniversário)
Eliane F.C.Lima
Nesta vida tenho caminhado
e nem a morte me há de parar,
porque sou "mar
nunca dantes navegado."
sábado, 13 de fevereiro de 2010
Consolo
Eliane F.C.Lima
Aguardo o pacote da esperança
que o destino vai pousar em minha porta.
Espero que ela não esteja torta,
combalida e gasta da andança.
Se ela me chegar inteira e pura,
o corpo são, a alma sã, sorriso farto,
recebo-a nas mãos, como em um parto,
embalo em meu colo com ternura.
Se ela me vier com o rosto branco,
trêmula a mão, a fala vagarosa,
abraço a doente e, temerosa,
faço uma oração, o peito aberto e franco.
Mas, se ao abrir a tampa, o derradeiro
e trágico desfecho se abalança,
visto que a última que morre é a esperança,
choro por mim, pois já morri primeiro.
Aguardo o pacote da esperança
que o destino vai pousar em minha porta.
Espero que ela não esteja torta,
combalida e gasta da andança.
Se ela me chegar inteira e pura,
o corpo são, a alma sã, sorriso farto,
recebo-a nas mãos, como em um parto,
embalo em meu colo com ternura.
Se ela me vier com o rosto branco,
trêmula a mão, a fala vagarosa,
abraço a doente e, temerosa,
faço uma oração, o peito aberto e franco.
Mas, se ao abrir a tampa, o derradeiro
e trágico desfecho se abalança,
visto que a última que morre é a esperança,
choro por mim, pois já morri primeiro.
sábado, 6 de fevereiro de 2010
Autonomia
Eliane F.C.Lima
Amo urubus e pardais.
Esvoaçam sua cor monótona,
sem valores humanos.
Desprezo por faisões,
canários e rouxinóis,
gaivotas, seus voos pictóricos,
de quadros na parede.
Desdém pelo que se deixa explorar
por olhos, ouvidos e mãos,
apreendidos em gaiolas,
orquestras e pincéis,
garfos e taças de vinho.
Amo urubus, amorais,
círculos de malditos,
vagarosos e feios, fatais,
irreverentes com a estética celeste.
Pardais, insolentes e impunes,
sem medo de pessoas,
saltinhos nos muros,
desafio e incredulidade.
Pousam em todo lugar,
amarronzando os beirais.
Amo urubus e pardais.
Esvoaçam sua cor monótona,
sem valores humanos.
Desprezo por faisões,
canários e rouxinóis,
gaivotas, seus voos pictóricos,
de quadros na parede.
Desdém pelo que se deixa explorar
por olhos, ouvidos e mãos,
apreendidos em gaiolas,
orquestras e pincéis,
garfos e taças de vinho.
Amo urubus, amorais,
círculos de malditos,
vagarosos e feios, fatais,
irreverentes com a estética celeste.
Pardais, insolentes e impunes,
sem medo de pessoas,
saltinhos nos muros,
desafio e incredulidade.
Pousam em todo lugar,
amarronzando os beirais.
(25-10-2009 - Observe a data. Compare-a com a matéria sobre João C.M.Neto, em meu blogue Literatura em vida 2 - clique aqui.)
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
Obesidade celeste
Eliane F.C.Lima (Registrado no Escritório de Direitos Autorais - RJ)
Tenho é inveja das nuvens,
que lá ficam,
brancas e rotundas,
quando querem,
rotundas e cinzas,
se apraz.
Tenho inveja é das nuvens,
líquidas,
que descem
e se apossam de tudo,
cada desvão.
Saciadas do rés,
poças trêmulas,
de telhados,
calhas ligeiras,
gotas pacientes,
reúnem suas partes,
em milhões,
água de dentro da rosa,
água de pé do passante,
seus rios,
sua urbanidade,
e sobem, limpas,
amigas do sol,
sua pureza imaculada,
branco novamente seu acolchoado.
Tenho é inveja das nuvens,
que lá ficam,
brancas e rotundas,
quando querem,
rotundas e cinzas,
se apraz.
Tenho inveja é das nuvens,
líquidas,
que descem
e se apossam de tudo,
cada desvão.
Saciadas do rés,
poças trêmulas,
de telhados,
calhas ligeiras,
gotas pacientes,
reúnem suas partes,
em milhões,
água de dentro da rosa,
água de pé do passante,
seus rios,
sua urbanidade,
e sobem, limpas,
amigas do sol,
sua pureza imaculada,
branco novamente seu acolchoado.
quinta-feira, 21 de janeiro de 2010
Momento
Eliane F.C.Lima
Façam silêncio enquanto o homem chora...
qualquer sussurro pode perturbá-lo.
Deixem o coração se indo embora,
saindo pelos olhos, rosto afora.
Façam silêncio enquanto o homem sofre...
fechada a agonia como em cofre.
Deixem o peito ir se dilatando,
farto de dor e palpitando cheio.
Um só gemido posto a mais no meio
pode rompê-lo, assim o estrago feito:
o sofrimento vazo pelo chão,
esfacelada a alma ao pé do leito,
mudo já e estraçalhado o coração.
Façam silêncio enquanto o homem chora...
qualquer sussurro pode perturbá-lo.
Deixem o coração se indo embora,
saindo pelos olhos, rosto afora.
Façam silêncio enquanto o homem sofre...
fechada a agonia como em cofre.
Deixem o peito ir se dilatando,
farto de dor e palpitando cheio.
Um só gemido posto a mais no meio
pode rompê-lo, assim o estrago feito:
o sofrimento vazo pelo chão,
esfacelada a alma ao pé do leito,
mudo já e estraçalhado o coração.
quinta-feira, 14 de janeiro de 2010
Colheita
Eliane F.C.Lima
Brotam as primeiras sementes,
um verde vinga na terra.
Brotam os primeiros sonhos,
um a um, cor de esperança.
Colherei sonhos maduros,
vermelhos, ocres, laranjas.
O futuro na fruteira,
disposto dentro do peito,
na boca um gosto doce,
nos olhos diversas cores,
a alma já dando flores,
goiabas, uvas, pitangas.
Brotam as primeiras sementes,
um verde vinga na terra.
Brotam os primeiros sonhos,
um a um, cor de esperança.
Colherei sonhos maduros,
vermelhos, ocres, laranjas.
O futuro na fruteira,
disposto dentro do peito,
na boca um gosto doce,
nos olhos diversas cores,
a alma já dando flores,
goiabas, uvas, pitangas.
terça-feira, 5 de janeiro de 2010
Madrugada

Somente azul ainda escuro,
preguiça de clarear.
Somente lua e estrelas,
preguiça de apagar.
Somente barco boiando,
somente peixes e rede,
somente a leve brisa,
somente um rosa rubor,
borrado o azul do céu.
Somente o choro das ondas,
um vaivém de dormir,
um vaivém de esquecer,
preguiça de retornar.
domingo, 27 de dezembro de 2009
Ao som de "Bound for infinity"
Posto aqui um poema que fiz ouvindo "Bound for infinity", Cd Prologue, do grupo Renaissance. Convido a quem queira ler o poema, a ouvir junto a canção, clicando no vídeo abaixo, para refazer o processo de criação. Agradeço e remeto ao YOUTUBE, de onde copiei a execução (clique aqui).
Ao som de “Bound for infinity”
Eliane F.C.Lima
(Ler, devagar, do início da voz feminina)
Abrem-se as águas do verde
e os vários verdes vão-se misturando.
Abrem-se as almas do verde.
E as várias almas vão-se misturando.
O caminho é longo.
Há um túnel em espiral horizontal
e as águas vão-se abrindo, girantes.
Penetro e penetro e penetro.
Misturam-se as águas do verde.
E as almas vão-se espiralando.
E nadando e voando nesse céu de águas.
E o túnel é contínuo.
Penetro na garganta do mar,
que me engole,
a girar no compasso do som.
(Pausar. Reiniciar apenas no refrão, lendo mais rapidamente)
E o verde é o somente,
o sempre desejável verde,
no vazio e no cheio da instável alma do mar.
O contínuo de ir me leva à paz,
que tem o gosto do odor do verde.
Paraíso liquefeito,
me acaricia por inteiro.
O amor é verde,
o carinho é verde,
verde tom, verde tontura, verde bom,
verde boca, verdes olhos, verdes pernas
que vão.
Túnel contínuo e longo,
que não acaba, mas cabe
no verde da invasão.
(Seguir a beleza da voz feminina até o final).
terça-feira, 15 de dezembro de 2009
terça-feira, 8 de dezembro de 2009
A estrada
Eliane F.C.Lima
Sigo esquecendo quem me esqueceu,
que da vida o que eu queria eram as lembranças.
São sombras vagas, vagas as pegadas,
apenas marcas que já não se acham.
Pego a taça, que está vazia,
aspiro o fundo, cheiro esquecido.
Só uma manchinha de afetos idos,
abandonada como última gota.
Até a taça – estará rachada? –
está largada sobre a pedra fria.
Onde andarão os amigos, companheiros,
aqueles que comigo sempre iam,
os que me davam a mão, me afagavam,
na verdade, os que sempre me queriam?
Ando lembrando quem me esqueceu,
embora não vislumbre um rosto firme,
sombras de sombras, vultos enlutados.
Em algum lugar, a festa segue,
as vozes riem, as mãos se entrelaçam.
Em algum lugar, a dança voa,
as conversas se rompem e se retomam.
Em algum lugar, pessoas amam,
se odeiam, se divertem ou se casam.
Em algum lugar... será passado?
Sigo esquecendo quem me esqueceu,
que da vida o que eu queria eram as lembranças.
São sombras vagas, vagas as pegadas,
apenas marcas que já não se acham.
Pego a taça, que está vazia,
aspiro o fundo, cheiro esquecido.
Só uma manchinha de afetos idos,
abandonada como última gota.
Até a taça – estará rachada? –
está largada sobre a pedra fria.
Onde andarão os amigos, companheiros,
aqueles que comigo sempre iam,
os que me davam a mão, me afagavam,
na verdade, os que sempre me queriam?
Ando lembrando quem me esqueceu,
embora não vislumbre um rosto firme,
sombras de sombras, vultos enlutados.
Em algum lugar, a festa segue,
as vozes riem, as mãos se entrelaçam.
Em algum lugar, a dança voa,
as conversas se rompem e se retomam.
Em algum lugar, pessoas amam,
se odeiam, se divertem ou se casam.
Em algum lugar... será passado?
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
Ação
Eliane F.C.Lima
Sou mãe.
Mas um homem não me fez um filho.
No mínimo:
um homem fez um filho comigo.
No máximo:
meu óvulo, ativo,
atraiu espermatozóides,
espavoridos,
pegou um pelo rabo.
Sou mãe.
Mas um homem não me fez um filho.
No mínimo:
um homem fez um filho comigo.
No máximo:
meu óvulo, ativo,
atraiu espermatozóides,
espavoridos,
pegou um pelo rabo.
terça-feira, 17 de novembro de 2009
Ressurreição
Eliane F.C.Lima
A primeira vez em que nasci,
foi à força que eu saí,
frágil, fúcsia, furiosa.
A vida foi me empurrando,
sempre, sempre a seu comando,
calma, crente ou curiosa.
Enquanto a vida ia,
a todo momento eu nascia,
louca, lâmina, lamentosa.
Hoje nasço ainda de novo,
mas, aos tapas, quebro o ovo,
amena, amável ou amargosa.
A primeira vez em que nasci,
foi à força que eu saí,
frágil, fúcsia, furiosa.
A vida foi me empurrando,
sempre, sempre a seu comando,
calma, crente ou curiosa.
Enquanto a vida ia,
a todo momento eu nascia,
louca, lâmina, lamentosa.
Hoje nasço ainda de novo,
mas, aos tapas, quebro o ovo,
amena, amável ou amargosa.
segunda-feira, 9 de novembro de 2009
Harmonia
sexta-feira, 6 de novembro de 2009
quinta-feira, 5 de novembro de 2009
A filha
Eliane F.C.Lima
Nasci. Na mão, convite alheio.
Entrei: festa desconhecida.
A música não era para mim,
os fogos não eram para mim,
o brinde não era para mim.
Olhei, dancei, bebi o que não era meu.
Ainda hoje me sinto estrangeira,
todos indagam quem sou.
Temo ainda que no final da festa,
eu, outra vez, encontre porta errada,
entrando em casa estranha eternamente.
Nasci. Na mão, convite alheio.
Entrei: festa desconhecida.
A música não era para mim,
os fogos não eram para mim,
o brinde não era para mim.
Olhei, dancei, bebi o que não era meu.
Ainda hoje me sinto estrangeira,
todos indagam quem sou.
Temo ainda que no final da festa,
eu, outra vez, encontre porta errada,
entrando em casa estranha eternamente.
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
Tempo
Eliane F.C.Lima
Metade da vida:
planejamento do futuro.
O resto da vida:
lembrança do passado.
Vida anulada:
perdido o presente.
Metade da vida:
planejamento do futuro.
O resto da vida:
lembrança do passado.
Vida anulada:
perdido o presente.
Primeva
Eliane F.C.Lima
Voltar ao ovo,
quer seja útero,
ao guardado,
à hipótese,
projeto.
Voltar ao ovo,
à espera,
esperança,
ao silêncio,
proteção.
Voltar ao ovo,
quer seja óvulo,
primitivo,
inconsciência,
círculo,
hermético,
ovo.
Voltar ao ovo,
quer seja útero,
ao guardado,
à hipótese,
projeto.
Voltar ao ovo,
à espera,
esperança,
ao silêncio,
proteção.
Voltar ao ovo,
quer seja óvulo,
primitivo,
inconsciência,
círculo,
hermético,
ovo.
quinta-feira, 29 de outubro de 2009
Aspas simples
Eliane F.C.Lima
Uma pipa é um ser,
extensão de braço,
extensão de mão,
olhos, boca aberta,
sua atenção;
voando no ar,
gestos quebradiços,
se ela vai ou volta.
Uma pipa é um ser,
cabeça e cauda rota,
um balé gracioso,
vírgula ao vento,
peixe fino e aéreo,
agulha de papel
costurando o ar.
Uma pipa é um ser,
extensão de braço,
extensão de mão,
olhos, boca aberta,
sua atenção;
voando no ar,
gestos quebradiços,
se ela vai ou volta.
Uma pipa é um ser,
cabeça e cauda rota,
um balé gracioso,
vírgula ao vento,
peixe fino e aéreo,
agulha de papel
costurando o ar.
Corrente
Eliane F.C.Lima
O rio da vida.
Ora caudaloso,
ora fio d’água;
embalo de berço,
ora suas pedras,
pouso de sereia,
ou dente de cão.
A vida é um rio.
Suas correntezas,
árvore arrancada,
sua erosão.
Seus rodamoinhos,
bicho carregado,
galho em rodopio,
suas corredeiras,
tombo, queda-d’água.
O rio da vida,
seu prazo é o mar.
O rio da vida.
Ora caudaloso,
ora fio d’água;
embalo de berço,
ora suas pedras,
pouso de sereia,
ou dente de cão.
A vida é um rio.
Suas correntezas,
árvore arrancada,
sua erosão.
Seus rodamoinhos,
bicho carregado,
galho em rodopio,
suas corredeiras,
tombo, queda-d’água.
O rio da vida,
seu prazo é o mar.
domingo, 11 de outubro de 2009
Momento certo
Eliane F.C.Lima
Dê um abraço por mim
e dê um beijo por mim.
Existe uma hora certa.
A minha hora eu perdi.
E não a perca por mim.
Existe um ponto exato
que deve ser o começo,
mas pode também ser fim.
Existe um ponto exato,
o ponto em que me perdi.
E não o perca por mim.
Existe a vida exata,
que nunca é não, é só sim.
A minha vida eu perdi,
não perca a sua por mim.
Dê um abraço por mim
e dê um beijo por mim.
E viva a vida por mim.
Dê um abraço por mim
e dê um beijo por mim.
Existe uma hora certa.
A minha hora eu perdi.
E não a perca por mim.
Existe um ponto exato
que deve ser o começo,
mas pode também ser fim.
Existe um ponto exato,
o ponto em que me perdi.
E não o perca por mim.
Existe a vida exata,
que nunca é não, é só sim.
A minha vida eu perdi,
não perca a sua por mim.
Dê um abraço por mim
e dê um beijo por mim.
E viva a vida por mim.
A lavadeira

A lavadeira da bica não entende de modas.
Usa saia estampada e blusa estampada.
Usa saia amarela com blusa roxa.
A lavadeira da bica não vê o bom gosto da patroa.
Roupa dela: dinheiro da comida;
sua roupa: cobertura do pobre corpo pobre.
A lavadeira da bica:
sabe o preço da roupa a lavar pela recomendação da patroa.
Reflexos
Eliane F.C.Lima
Este espelho me olha assombrado
e desconhece seu rosto refletido;
não sabe de quem é o riso gelado,
não consegue ver bem o olhar sumido.
Espelho, espelho meu, que ora duplico,
espelho, espelho meu, eu lhe suplico,
não fuja, estupefato, do semblante
que é meu, posto que é seu, por semelhante.
Encare a boca, aflita, também sua,
tal qual a dor perene e crua,
e a lágrima que a sua face molha.
Se hoje sou só eu que não sorrio,
se nesses dias sou a que não olha,
também há no espelho o que é sombrio.
Este espelho me olha assombrado
e desconhece seu rosto refletido;
não sabe de quem é o riso gelado,
não consegue ver bem o olhar sumido.
Espelho, espelho meu, que ora duplico,
espelho, espelho meu, eu lhe suplico,
não fuja, estupefato, do semblante
que é meu, posto que é seu, por semelhante.
Encare a boca, aflita, também sua,
tal qual a dor perene e crua,
e a lágrima que a sua face molha.
Se hoje sou só eu que não sorrio,
se nesses dias sou a que não olha,
também há no espelho o que é sombrio.
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
Paz
Eliane F.C.Lima
É retomar o fio perdido da alma
e enovelá-la, aos poucos, caprichosamente,
até torná-la macia, acariciável.
É saber de onde se começa e para onde se vai
e, em círculos,
voltar sempre ao mesmo lugar.
É estar fora, firme e no caminho.
É estar dentro, quente, amorável,
envolver, sendo envolvida.
Como abraçar a mim mesma,
devolver-me o calor de meus braços,
novelo e mãos, mãos e novelo.
É como um cão enrodilhado,
sonhando felicidades pequeninas,
quase sorrindo,
de alma apaziguada, sem conflitos,
nem tentativas,
a não ser a de dormir aquecido sobre si.
É retomar o fio perdido da alma
e enovelá-la, aos poucos, caprichosamente,
até torná-la macia, acariciável.
É saber de onde se começa e para onde se vai
e, em círculos,
voltar sempre ao mesmo lugar.
É estar fora, firme e no caminho.
É estar dentro, quente, amorável,
envolver, sendo envolvida.
Como abraçar a mim mesma,
devolver-me o calor de meus braços,
novelo e mãos, mãos e novelo.
É como um cão enrodilhado,
sonhando felicidades pequeninas,
quase sorrindo,
de alma apaziguada, sem conflitos,
nem tentativas,
a não ser a de dormir aquecido sobre si.
A sereia
Eliane F.C.Lima
A sexta-feira acontece:
há uma vaga felicidade,
uma indefinida promessa de não-sei-quê.
Cada minuto é como uma porta aberta para um mundo
[ansioso,
para um fundo fugidio e convidativamente sensual.
A sexta-feira é o sonho, a esperança, o começo.
A sexta-feira, desde a quarta-feira,
requebra, chama, pisca e se encolhe.
A sexta-feira é sereia e ninguém resiste a ela.
Mas a sexta-feira finge que é tímida
e, quase sempre, não se dá.
Finda o domingo e nada acontece.
Agora vamos passar a segunda e a terça odiando a
[sexta-feira,
até que ela acene com seu faiscante vestido de festa
ou desabotoe, parcialmente, sua langerie.
A sexta-feira acontece:
há uma vaga felicidade,
uma indefinida promessa de não-sei-quê.
Cada minuto é como uma porta aberta para um mundo
[ansioso,
para um fundo fugidio e convidativamente sensual.
A sexta-feira é o sonho, a esperança, o começo.
A sexta-feira, desde a quarta-feira,
requebra, chama, pisca e se encolhe.
A sexta-feira é sereia e ninguém resiste a ela.
Mas a sexta-feira finge que é tímida
e, quase sempre, não se dá.
Finda o domingo e nada acontece.
Agora vamos passar a segunda e a terça odiando a
[sexta-feira,
até que ela acene com seu faiscante vestido de festa
ou desabotoe, parcialmente, sua langerie.
Drama
Eliane F.C.Lima
Vi caras sentadas
de bocas tristonhas,
olhares gementes
de almas caladas
e línguas dementes.
Vi olhos que gritam,
vi olhos que fitam
sem ver, nem querer.
Vi homens, mulheres,
sob cujas peles,
o sangue se esvai:
sem boca, sem ai.
Vi corpos sem alma,
pessoas sem calma,
e sem coração,
silêncio profundo,
seres de outro mundo,
grades de prisão.
Vi caras sentadas,
vi pés sem estradas,
morte...solidão.
Vi sinos e sinas,
torres em ruínas,
rastro de correntes,
as dores de Jó.
Vi bicho, vi gente,
vi pêndulo e pó.
Vi caras sentadas
de bocas tristonhas,
olhares gementes
de almas caladas
e línguas dementes.
Vi olhos que gritam,
vi olhos que fitam
sem ver, nem querer.
Vi homens, mulheres,
sob cujas peles,
o sangue se esvai:
sem boca, sem ai.
Vi corpos sem alma,
pessoas sem calma,
e sem coração,
silêncio profundo,
seres de outro mundo,
grades de prisão.
Vi caras sentadas,
vi pés sem estradas,
morte...solidão.
Vi sinos e sinas,
torres em ruínas,
rastro de correntes,
as dores de Jó.
Vi bicho, vi gente,
vi pêndulo e pó.
Fá-lo-ei, o homem
Eliane F.C.Lima
Falo hei,
para apontar as profundezas da feminilidade,
aberta e sugativa!
Falo há,
só como espada,
para derrubar as muralhas do preconceito
onde se erguem mulheres.
Falo sim, falo alto,
porque vaginas são como bocas mágicas:
comem falsos deuses e devolvem homens.
Falo hei,
para apontar as profundezas da feminilidade,
aberta e sugativa!
Falo há,
só como espada,
para derrubar as muralhas do preconceito
onde se erguem mulheres.
Falo sim, falo alto,
porque vaginas são como bocas mágicas:
comem falsos deuses e devolvem homens.
sábado, 3 de outubro de 2009
Infinir
Eliane F.C.Lima
Caixa de surpresas é a vida.
Acontece dentro do planejado:
surpresas.
Termina dentro do imprevisível:
a morte.
Caixa de madeira é a morte.
Caixa de surpresas é a vida.
Acontece dentro do planejado:
surpresas.
Termina dentro do imprevisível:
a morte.
Caixa de madeira é a morte.
Último ato
Eliane F.C.Lima
A morte é o término do espetáculo:
cadeiras vazias, palco vazio, escuridão e silêncio.
A morte é um fim de festa:
a agitação se foi;
só resta o resto a recolher.
A morte é o término do espetáculo:
cadeiras vazias, palco vazio, escuridão e silêncio.
A morte é um fim de festa:
a agitação se foi;
só resta o resto a recolher.
A viagem
Eliane F.C.Lima
É para fazer uma viagem
que embarco no teu navio,
com calmaria ou tempestade.
A luz do teu corpo guia meu destino
e não sei se é prazer ou se corro perigo.
É para fazer um destino
que embarco na tua tempestade,
com luz ou com perigo.
A calmaria do teu navio guia meu prazer
e não sei se é corpo ou viagem.
É para ter um prazer
que embarco na tua luz,
com um navio ou com teu corpo.
O perigo da tua viagem guia minha calmaria
e não sei se é tempestade ou destino.
É para fazer uma viagem
que embarco no teu navio,
com calmaria ou tempestade.
A luz do teu corpo guia meu destino
e não sei se é prazer ou se corro perigo.
É para fazer um destino
que embarco na tua tempestade,
com luz ou com perigo.
A calmaria do teu navio guia meu prazer
e não sei se é corpo ou viagem.
É para ter um prazer
que embarco na tua luz,
com um navio ou com teu corpo.
O perigo da tua viagem guia minha calmaria
e não sei se é tempestade ou destino.
Sem roteiro
Eliane F.C.Lima
Descendo por suas costas
minha mão desliza,
cobra vertiginosa.
Sub-reptícia, a sibilina se insinua.
Vício e volúpia, volta e virada.
Procura cantos e desvios,
vagos e vagas, montanhas.
Minha mão na sua nuca,
adivinha o arrepio,
sente do peito o cio.
Tatuagem deslizante,
mordidas ofídicas nas pontas dos picos.
A serpente de meu braço,
descendo sobre seu ventre,
se enrosca no entre
de suas coxas.
Abraço que só se abrasa
em úmidas, paragens toscas,
por dentro de grutas e roscas,
timidamente, se esconde,
gulosa, no centro do onde.
Descendo por suas costas
minha mão desliza,
cobra vertiginosa.
Sub-reptícia, a sibilina se insinua.
Vício e volúpia, volta e virada.
Procura cantos e desvios,
vagos e vagas, montanhas.
Minha mão na sua nuca,
adivinha o arrepio,
sente do peito o cio.
Tatuagem deslizante,
mordidas ofídicas nas pontas dos picos.
A serpente de meu braço,
descendo sobre seu ventre,
se enrosca no entre
de suas coxas.
Abraço que só se abrasa
em úmidas, paragens toscas,
por dentro de grutas e roscas,
timidamente, se esconde,
gulosa, no centro do onde.
domingo, 27 de setembro de 2009
Indivíduo
Eliane F.C.Lima
O desejo aquece pensamentos
e choca ações.
O desejo ferve e entorna,
mas aviva o fogo.
O desejo é febre,
dá febre,
e há convulsões.
O desejo convulsiona o caráter
e desvia o comportamento.
O desejo faz e desfaz,
manda e desmanda,
é tirano, é bandido,
é dócil, é doce.
O desejo é o indivíduo
e faz multidões
e perpetua a espécie.
O desejo é uma espécie
de fogo,
de febre,
de doce,
de tirano,
de ação,
de pensamento,
de multidão.
O desejo aquece pensamentos
e choca ações.
O desejo ferve e entorna,
mas aviva o fogo.
O desejo é febre,
dá febre,
e há convulsões.
O desejo convulsiona o caráter
e desvia o comportamento.
O desejo faz e desfaz,
manda e desmanda,
é tirano, é bandido,
é dócil, é doce.
O desejo é o indivíduo
e faz multidões
e perpetua a espécie.
O desejo é uma espécie
de fogo,
de febre,
de doce,
de tirano,
de ação,
de pensamento,
de multidão.
A materna noite
Eliane F.C.Lima
Que a noite sempre venha e caia em volta de mim como um
[útero.
Que seja de mãe a penumbra que fecha meus olhos;
que seja de mulher a mão noturna que afaga meus cabelos,
que apazigua minhas dúvidas,
que entorpece meus conflitos.
É bom que a noite sempre vença o dia, todo dia: todo noite.
Que a noite sempre venha e caia em volta de mim como um
[útero.
Que seja de mãe a penumbra que fecha meus olhos;
que seja de mulher a mão noturna que afaga meus cabelos,
que apazigua minhas dúvidas,
que entorpece meus conflitos.
É bom que a noite sempre vença o dia, todo dia: todo noite.
Indo
Eliane F.C.Lima
Viajo sozinha.
Deixei a mala.
Sem lembrança do que ficou.
Nem o cheiro do passado.
Não olho para trás.
Nem observo a paisagem.
Não ouço o canto dos pássaros,
não vejo o verde,
nada de fotografias.
Sem álbum de viagem.
Não fruo o vento.
Nem sei se há vento.
Mas piso a rudeza do chão
e as duras pedras
que não sei quem atira.
Fechei a porta da estrada:
não quero que ninguém me acompanhe.
Tampouco sigo pegadas.
Não tracei um percurso.
Não procuro atalhos.
Não planejo aonde chegar.
Mas há um caminho
que eu caminho,
querendo que não seja longo.
Viajo sozinha.
Deixei a mala.
Sem lembrança do que ficou.
Nem o cheiro do passado.
Não olho para trás.
Nem observo a paisagem.
Não ouço o canto dos pássaros,
não vejo o verde,
nada de fotografias.
Sem álbum de viagem.
Não fruo o vento.
Nem sei se há vento.
Mas piso a rudeza do chão
e as duras pedras
que não sei quem atira.
Fechei a porta da estrada:
não quero que ninguém me acompanhe.
Tampouco sigo pegadas.
Não tracei um percurso.
Não procuro atalhos.
Não planejo aonde chegar.
Mas há um caminho
que eu caminho,
querendo que não seja longo.
Procurando alguém
Eliane F.C.Lima
À minha amiga e poeta Marise Ribeiro
Andei na vida procurando coisas:
tinha certezas e muito esplendor.
Andei na vida procurando tudo,
achei pouca alegria, muita dor.
A cada fase, uma busca nova,
a cada curva, um encontro inusitado,
achando aquilo que não procurei,
esfacelada pelo encontrado.
Hoje só busco a mim: quero me achar.
A vida me perdeu a cada esquina.
Busco, ao menos, do antigo olhar,
a esperança confiante da menina.
À minha amiga e poeta Marise Ribeiro
Andei na vida procurando coisas:
tinha certezas e muito esplendor.
Andei na vida procurando tudo,
achei pouca alegria, muita dor.
A cada fase, uma busca nova,
a cada curva, um encontro inusitado,
achando aquilo que não procurei,
esfacelada pelo encontrado.
Hoje só busco a mim: quero me achar.
A vida me perdeu a cada esquina.
Busco, ao menos, do antigo olhar,
a esperança confiante da menina.
sexta-feira, 25 de setembro de 2009
Poema aos simples
Eliane F.C.Lima
Quero a simplicidade dos poucos pensamentos de uma
[pessoa ignorante;
a simplicidade da roupa preta debruada de branco;[pessoa ignorante;
a simplicidade do chinelo, do banho de rio...
e dos urubus dando voltas no azul.
Quero a simplicidade desses mesmos urubus,
pousados, espiando a chuva dos beirais dos telhados.
Para quem vai chegar
Eliane F.C.Lima
por sobre o muro;
quer ver, aflita,
você chegar.
Em verde esforço,
crescendo em tronco,
espinho e folhas,
sorvendo o sol,
sugando a terra,
bebendo a chuva,
vai para o alto,
o duro muro.
Em firme posto,
mirar a rua,
o seu caminho,
seu doce passo,
seu doce rosto,
seu acenar.
Enquanto sobe,
saudosa chora,
rosas lilases,
que, contumazes,
vão perfumar.
Triste sou eu:
não sei chorar.
Vejo-me na roseira:
tenta olharpor sobre o muro;
quer ver, aflita,
você chegar.
Em verde esforço,
crescendo em tronco,
espinho e folhas,
sorvendo o sol,
sugando a terra,
bebendo a chuva,
vai para o alto,
o duro muro.
Em firme posto,
mirar a rua,
o seu caminho,
seu doce passo,
seu doce rosto,
seu acenar.
Enquanto sobe,
saudosa chora,
rosas lilases,
que, contumazes,
vão perfumar.
Triste sou eu:
não sei chorar.
A sereia e o mar
Eliane F.C.Lima
Esse amor chegou, aos poucos, devagar,
chegou como chega um manso mar
até a areia.
Meu coração distraído, sem sabê-lo,
quedou-se ali, penteando o cabelo,
qual sereia.
E a maré, docemente, foi subindo.
Meu coração, orgulhoso, sucumbindo
à maré cheia.
Quando viu era céu, mar, amor.
E batia, afogado, sem ter dor,
em água alheia.
Esse amor chegou, aos poucos, devagar,
chegou como chega um manso mar
até a areia.
Meu coração distraído, sem sabê-lo,
quedou-se ali, penteando o cabelo,
qual sereia.
E a maré, docemente, foi subindo.
Meu coração, orgulhoso, sucumbindo
à maré cheia.
Quando viu era céu, mar, amor.
E batia, afogado, sem ter dor,
em água alheia.
Dentro do túnel
Eliane F.C.Lima
Onde será que eles vão com tanta pressa?
O que será que buscam?
O fim do mundo?
Ou o princípio?
Onde será que eles vão com tanta pressa?
Que sinais indicam sua rota?
Que motivos impulsionam sua partida?
Que arcanjos esperarão sua chegada?
Será mandado de Deus?
Ou lei dos homens?
Será medo ou coragem?
Busca ou fuga?
Haverá um ponto de chegada?
Ou o importante é só ir?
Onde será que eles vão com tanta pressa?
Onde será que eles vão com tanta pressa?
O que será que buscam?
O fim do mundo?
Ou o princípio?
Onde será que eles vão com tanta pressa?
Que sinais indicam sua rota?
Que motivos impulsionam sua partida?
Que arcanjos esperarão sua chegada?
Será mandado de Deus?
Ou lei dos homens?
Será medo ou coragem?
Busca ou fuga?
Haverá um ponto de chegada?
Ou o importante é só ir?
Onde será que eles vão com tanta pressa?
Ser
Eliane F.C.Lima
Cada pessoa é uma pegada na areia:
a onda apaga.
Uma pessoa é só espuma na areia:
o vento seca.
Uma pessoa é resto de mar na areia:
a areia bebe.
Uma pessoa é onda que vem para a areia,
que vai, não volta.
Cada pessoa é uma pegada na areia:
a onda apaga.
Uma pessoa é só espuma na areia:
o vento seca.
Uma pessoa é resto de mar na areia:
a areia bebe.
Uma pessoa é onda que vem para a areia,
que vai, não volta.
Soneto aos cinquenta anos
Eliane F.C.Lima
Vejo marcada, assim, em minha face,
a frágil flor da perigosa vida,
que é jardim onde se criam flores
que germinam, vivendo de ferida.
Cada ruga que marca minha pele
é um caminho vago e sem saída
das emboscadas lábeis dessa lida,
das armadilhas dúbias dessa sorte.
Nunca percebo um rosto de pessoa,
mas um tempo, banido, que escoa,
entre sonho e guerra, ponte ou corte.
Vejo impresso, assim, em meu destino,
um rosto que reflete o desatino
de lutar, dia a dia, até a morte.
Uma história medieval
Eliane F.C.Lima
Dedicado à Amélia de Oliveira (vá a meu blog Literatura em vida 2, no item Literatura de ontem 2, clicando aqui) e a todas as Amélias, o que parece não ser um nome, mas um destino.
Se há anjos, também há dragões,
que vomitam fogo
e parecem consumir o mundo.
Dragões sempre ameaçam cidades.
Mas, também, sempre há um herói
que quer salvar uma donzela solitária.
E uma cabeça carregada, pelos cabelos,
entre os gritos do povo.
O herói procura por florestas inóspitas
e segue o rumor dos urros quentes.
Mas é minha donzela, finalmente,
quem vence os anjos
e passa com a cabeça do herói,
triunfantemente sozinha,
entre as labaredas aconchegantes de seus dragões.
que vomitam fogo
e parecem consumir o mundo.
Dragões sempre ameaçam cidades.
Mas, também, sempre há um herói
que quer salvar uma donzela solitária.
E uma cabeça carregada, pelos cabelos,
entre os gritos do povo.
O herói procura por florestas inóspitas
e segue o rumor dos urros quentes.
Mas é minha donzela, finalmente,
quem vence os anjos
e passa com a cabeça do herói,
triunfantemente sozinha,
entre as labaredas aconchegantes de seus dragões.
Só amor
Eliane F.C.Lima
Sou uma flor quase branca
e macia, incrivelmente macia
e delicada,
que tem uma vertigem
ao imaginar o contato,
em suas pétalas,
da primeira gota de orvalho.Uma flor que fugiu do lilás
e foge do sol,
que ama a sombra
e a noite só de sombras;
que deixa a tal gota de orvalho
a primeira -
ou, às vezes, a última - escorrer
para prolongar o prazer,
vagarosamente, em sua intimidade,
acariciando sua inefável,
intocável película.
Uma flor não amarela,
não branca,
mas suave e delicada,
que imagina que a gota de orvalho
é outra flor,
e é fria,
e o escorrer é carinho
dessa flor apaixonada,
dessa flor que escorre
e volta sempre,
ainda mais delicada
- se é possível -
e transparente,
que fugiu, definitivamente, do branco,
[do amarelo, do lilás, de qualquer cor.
A cada início de noite,
desse modo,
tem um estremecer,
ao imaginar
que é flor o que é líquido,
que é amor
o que é amor.
O barco
Eliane F.C.Lima
Naquela ilha, batem marés de felicidade.
Naquela ilha, rolam as espumas da calma.
Naquela ilha, as aves da tranquilidade sobrevoam...
e pousam.
e pousam.
É naquela ilha que crescem as verdes árvores do silêncio.
Naquela ilha, o sol não fere, cai como uma névoa,
não tem pontas a sua luz, só ressalta as formas da paz.
Aquela ilha não tem praias e é cercada de pedras,
qualquer um não chega lá.
Aquela ilha fica longe e eu estou aqui.
Não sou maré, não sou espuma, nem ave.
Devo descobrir um meio para me aproximar
e plantar minhas sementes.
Mas só eu sei
que o melhor daquela ilha é olhar...
silenciosamente...
e ter um sonho verde de chegar lá.
Esse útero
Eliane F.C.Lima
Navega no espaço, solta e silenciosa,
como um seio-esfera,
como totalidade,
a mãe.
Fechada sobre si,
fechada sobre mim,
abraça a cria: mãe.
Abre seu ventre
e me dá ao universo,
no meio da noite.
Olhos de água,
corpo de terra,
hálito de vento,
mãos de árvores que me acenam,
na tempestade.
Amamenta-me com seus rios, cascatas, sua chuva.
Deusa-Terra, mãe Gaia,
que me guarda,
que me receberá
novamente e para sempre,
filha de sua mãe,
em seu rotundo ventre.
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